sábado, 29 de janeiro de 2011

Pássaro encantado



Era uma vez uma menina que tinha um pássaro como seu melhor amigo.


Ele era um pássaro diferente de todos os demais: Era encantado.


Os pássaros comuns, se a porta da gaiola estiver aberta, vão embora para nunca mais voltar.


Mas o pássaro da menina voava livre e vinha quando sentia saudades...


Suas penas também eram diferentes. Mudavam de cor.


Eram sempre pintadas pelas cores dos lugares estranhos e longínquos por onde voava.


Certa vez, voltou totalmente branco, cauda enorme de plumas fofas como o algodão.


Menina, eu venho de montanhas frias e cobertas de neve, tudo maravilhosamente branco e puro, brilhando sob a luz da lua, nada se ouvindo a não ser o barulho do vento que faz estalar o gelo que cobre os galhos das árvores. Trouxe, nas minhas penas, um pouco de encanto que eu vi, como presente para você....


E assim ele começava a cantar as canções e as estórias daquele mundo que a menina nunca vira.


Até que ela adormecia, e sonhava que voava nas asas do pássaro.


Outra vez voltou vermelho como fogo, penacho dourado na cabeça.


... Venho de uma terra queimada pela seca, terra quente e sem água, onde os grandes, os pequenos e os bichos sofrem a tristeza do sol que não se apaga.


Minhas penas ficaram como aquele sol e eu trago canções tristes daqueles que gostariam de ouvir o barulho das cachoeiras e ver a beleza dos campos verdes.


E de novo começavam as estórias.


A menina amava aquele pássaro e podia ouvi-lo sem parar, dia após dia.


E o pássaro amava a menina, e por isso voltava sempre.


Mas chegava sempre uma hora de tristeza.


Tenho que ir, ele dizia.


Por favor não vá, fico tão triste, terei saudades e vou chorar.....


Eu também terei saudades, dizia o pássaro. Eu também vou chorar.


Mas eu vou lhe contar um segredo: As plantas precisam da água, nós precisamos do ar, os peixes precisam dos rios...


E o meu encanto precisa da saudade. É aquela tristeza, na espera da volta, que faz com que minhas penas fiquem bonitas.


Se eu não for, não haverá saudades.


Eu deixarei de ser um pássaro encantado e você deixará de me amar.


Assim ele partiu. A menina sozinha, chorava de tristeza à noite.


Imaginando se o pássaro voltaria. E foi numa destas noites que ela teve uma idéia malvada.


Se eu o prender numa gaiola, ele nunca mais partirá; será meu para sempre.


Nunca mais terei saudades, e ficarei feliz.


Com estes pensamentos comprou uma linda gaiola, própria para um pássaro que se ama muito. E ficou à espera.


Finalmente ele chegou, maravilhoso, com suas novas cores, com estórias diferentes para contar.


Cansado da viagem, adormeceu.


Foi então que a menina, cuidadosamente, para que ele não acordasse, o prendeu na gaiola para que ele nunca mais a abandonasse. E adormeceu feliz.


Foi acordar de madrugada, com um gemido triste do pássaro.


Ah! Menina... Que é que você fez? Quebrou-se o encanto. Minhas penas ficarão feias e eu me esquecerei das estórias....


Sem a saudade, o amor irá embora...


A menina não acreditou. Pensou que ele acabaria por se acostumar.


Mas isto não aconteceu. O tempo ia passando, e o pássaro ia ficando diferente.


Caíram suas plumas, os vermelhos, os verdes e os azuis das penas transformaram-se num cinzento triste.


E veio o silêncio, deixou de cantar.


Também a menina se entristeceu. Não, aquele não era o pássaro que ela amava.


E de noite ela chorava pensando naquilo que havia feito ao seu amigo...


Até que não mais agüentou.


Abriu a porta da gaiola.


Pode ir, pássaro, volte quando quiser...


Obrigado, menina. É, eu tenho que partir. É preciso partir para que a saudade chegue e eu tenha vontade de voltar. Longe, na saudade, muitas coisas boas começam a crescer dentro da gente.


Sempre que você ficar com saudades, eu ficarei mais bonito.


Sempre que eu ficar com saudades, você ficará mais bonita. E você se enfeitará para me esperar...


E partiu. Voou que voou para lugares distantes. A menina contava os dias, e cada dia que passava a saudade crescia.


Que bom, pensava ela, meu pássaro está ficando encantado de novo...


E ela ia ao guarda-roupa, escolher os vestidos; e penteava seus cabelos, colocava flores nos vasos...


Nunca se sabe. Pode ser que ele volte hoje...


Sem que ela percebesse, o mundo inteiro foi ficando encantado como o pássaro.


Porque em algum lugar ele deveria estar voando. De algum lugar ele haveria de voltar.


AH! Mundo maravilhoso que guarda em algum lugar secreto o pássaro encantado que se ama...


E foi assim que ela, cada noite ia para a cama, triste de saudade, mas feliz com o pensamento.


Quem sabe ele voltará amanhã....


E assim dormia e sonhava com a alegria do reencontro.






Rubens Alves

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